02 janeiro, 2019

ASSÉDIO

O assédio no trabalho não se esgota no mero assédio de cariz sexual, mas antes num fenómeno em que ocorram, no âmbito da relação laboral, violação dos deveres do empregador em relação ao trabalhador que atentem contra os direitos fundamentais do trabalhador, designadamente, a sua dignidade e integridade psíquica e moral (os denominados “direitos de personalidade” do trabalhador). 
Trata-se da noção mais abrangente de “assédio moral” (também conhecido como “mobbing” ou "hostilização no trabalho") que tem vindo a ser consagrada nas mais recentes legislações laborais dos países lusófonos. 
A prática de acto de assédio lesivo de trabalhador confere-lhe, para além da possibilidade de rescisão do contrato de trabalho, o direito à indemnização por danos patrimoniais e não patrimoniais, nos termos gerais de direito. 

Remissões legislativas: 
Portugal – artigo 29.º do CT 
Brasil – artigo 483º, alínea e), da CLT (1) 
Angola – (2) 
Moçambique – artigo 66, n.ºs 2 e 3, da LTM 
Cabo Verde – artigos 410.º (assédio sexual) e 411.º (assédio moral) do CL 
Timor Leste – artigo 7.º da LTTL 

(1) No Brasil, o “assédio sexual” é crime punido pelo artigo 216º-A, do Código Penal, na redação dada pela Lei nº 10.224, de 15 de Maio de 2001). O “assédio moral” para além da disposição genérica prevista na CLT (art.º 483º, alínea e)), tem vindo a ser construído por via jurisprudencial: vd., entre outros, Assédio Moral. Contrato de Inação. Indenização por Dano Moral “A tortura psicológica, destinada a golpear a auto-estima do empregado, visando forçar sua demissão ou apressar sua dispensa através de métodos que resultem em sobrecarregar o empregado de tarefas inúteis, sonegar-lhe informações e fingir que não o vê, resultam em assédio moral, cujo efeito é o direito à indenização por dano moral, porque ultrapassa o âmbito profissional, eis que minam a saúde física e mental da vítima e corrói a sua auto-estima. No caso dos autos, o assédio foi além, porque a empresa transformou o contrato de atividade em contrato de inação, quebrando o caráter sinalagmático do contrato de trabalho, e por conseqüência, descumprindo a sua principal obrigação que é a de fornecer trabalho, fonte de dignidade do empregado” (TRT 17ª R., RO nº 1315.2000.00.17.00.1, Ac. nº 2.276/200, DJ de 20.08.2002); Assédio Moral. Caracterização “O termo ‘assédio moral’ foi utilizado pela primeira vez pelos psicólogos e não faz muito tempo que entrou para o mundo jurídico. O que se denomina assédio moral, também conhecido como mobbing (Itália, Alemanha e Escandinávia), harcèlement moral (França), acoso moral (Espanha), terror psicológico ou assédio moral entre nós, além de outras denominações, são, a rigor, atentados contra a dignidade humana. De início, os doutrinadores o definiam como ‘a situação em que uma pessoa ou um grupo de pessoas exercem uma violência psicológica extrema, de forma sistemática e freqüente (em média uma vez por semana) e durante um tempo prolongado (em torno de uns 6 meses) sobre outra pessoa, a respeito da qual mantém uma relação assimétrica de poder no local de trabalho, com o objetivo de destruir as redes de comunicação da vítima, destruir sua reputação, perturbar o exercício de seus trabalhos e conseguir, finalmente, que essa pessoa acabe deixando o emprego’ (cf. Heinz Leymann, médico alemão e pesquisador na área de psicologia do trabalho, na Suécia, falecido em 1999, mas cujos textos foram compilados na obra de Noa Davenport e outras, intitulada Mobbing: Emotional Abuse in The American Work Place). O conceito é criticado por ser muito rigoroso. Esse comportamento ocorre não só entre chefes e subordinados, mas também na via contrária, e entre colegas de trabalho com vários objetivos, entre eles o de forçar a demissão da vítima, o seu pedido de aposentadoria precoce, uma licença para tratamento de saúde, uma remoção ou transferência. Não se confunde com outros conflitos que são esporádicos ou mesmo com más condições de trabalho, pois o assédio moral pressupõe o comportamento (ação ou omissão) por um período prolongado, premeditado, que desestabiliza psicologicamente a vítima. Se a hipótese dos autos revela violência psicológica intensa sobre o empregado, prolongada no tempo, que acabou por ocasionar, intencionalmente, dano psíquico (depressão e síndrome do pânico), marginalizando-o no ambiente de trabalho, procede a indenização por dano moral advindo do assédio em questão” (TRT-RO-01292-2003-057-03-00-3, 2ª T., DJ 11.08.2004).

(2) Em Angola, a LGTA não prevê nenhuma norma na qual a figura do assédio (sexual ou moral) seja definida e na qual estejam consagradas as diversas implicações da sua ocorrência no âmbito das relações de trabalho. 
Deste modo, o regime do assédio nas relações laborais no ordenamento jurídico angolano resulta directamente da tutela constitucional (Constituição da República de Angola) do direito à igualdade e não discriminação (art.º 23.º, n.ºs 1 e 2), do respeito pela dignidade da pessoa humana e integridade física e moral (art.º 31.º, n.º 1 e 2), do direito â liberdade e autodeterminação sexual (art.º 36.º, alíneas c) e d)), do direito ao bom nome e à reserva da intimidade da vida privada e familiar (art.º 32.º/1), e do direito ao trabalho, nomeadamente do direito à segurança no emprego e a condições de trabalho justas (art.º 76.º, n.ºs 1e 2), integrados na categoria dos direitos fundamentais que dispõem de eficácia directa e imediata nas relações de trabalho, eficácia que de resto é concretizada pela LGT (ex vi do art.º 28/2 da CRA) quando no art.º 4.º sob a epígrafe “Direito ao trabalho” estabelece que “todos os cidadãos têm direito ao trabalho livremente escolhido, com igualdade de oportunidades e sem qualquer descriminação baseada na raça, cor, sexo, origem étnica, estado civil, origem e condição social, razões religiosas, opinião política, filiação sindical e língua” (n.º 1), “o direito ao trabalho é inseparável do dever de trabalhar” (n.º 2), “todos os cidadãos têm direito à livre escolha e exercício de profissão” (n.º 3), e “as condições em que o trabalho é prestado devem respeitar as liberdades e a dignidade do trabalhador, permitindo-lhe satisfazer normalmente as suas necessidades e as da sua família, proteger a sua saúde e gozar de condições de vida decentes” (n.º 4).

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