68. Regime legal comum aos acidentes de trabalho e doenças profissionais
O art.º 226 da LT estabelece um “dever geral de prevenção” por parte do empregador, segundo o qual este é obrigado a adoptar medidas eficazes de prevenção de acidentes de trabalho e doenças profissionais e a investigar as respectivas causas e formas de as superar, em estreita colaboração com as comissões de segurança no trabalho constituídas na empresa (n.º 1).
Além disso, em colaboração com as associações sindicais, tem de informar o órgão competente da administração do trabalho (IGT) sobre a natureza, causas e consequências dos acidentes de trabalho ou doenças profissionais, o que naturalmente tem de ser visto conjugadamente com o disposto no art.º 42 do Regulamento da IGT, aprovado pelo Decreto n.º 45/2009, de 14 de Agosto, sobre a obrigatoriedade de os empregadores recolherem, organizarem e comunicarem à IGT os dados trimestrais relativos às doenças profissionais diagnosticadas e aos acidentes de trabalho ocorridos, que derem lugar à inactividade do sinistrado por período superior a um dia de trabalho (n.º 2).
68.1. Participação e comunicações
A lei impõe o dever de participação da ocorrência de acidente de trabalho ou de doença profissional ao empregador, participação que tanto pode ser feita pelo próprio trabalhador como por interposta pessoa (art.º 227/1 da LT).
Este dever de participação deve ser cumprido mediante a adopção do procedimento que se encontra exaustivamente regulado nos art.ºs 26 a 32 do RJATDP, donde se extrai, em síntese, que, tanto a ocorrência de qualquer acidente de trabalho, como o diagnóstico de uma doença profissional, devem ser participados ao empregador ou ao seu representante legal, verbalmente ou por escrito, nas 48 horas seguintes, pelo trabalhador sinistrado ou interposta pessoa, salvo se o empregador ou o seu representante legal o presenciar ou dele vier a ter conhecimento por outros meios no mesmo período (art.º 26/1 do RJATDP).
Se o estado do sinistrado, ou outra circunstância impeditiva atendível, não permitir o cumprimento do referido prazo de 48 horas, este contar-se-á a partir da data da cessação do impedimento (art.º 26/2 do RJATDP).
Se a lesão se revelar ou for reconhecida em data posterior à do acidente, o prazo contar-se-á a partir da data da revelação ou do reconhecimento (art.º 26/3 do RJATDP).
Nos casos em que o sinistrado não participar o acidente tempestivamente e, por tal motivo, tiver sido impossível ao empregador, ou ao seu representante legal, prestar-lhe a assistência necessária, a incapacidade judicialmente reconhecida como consequência daquela falta não confere direito às prestações previstas no Regulamento, na medida em que dela tenha resultado (art.º 26/4 do RJATDP).
Por outro lado, a lei impõe, igualmente, um dever de comunicação da entidade empregadora da ocorrência de acidentes de trabalho e doenças profissionais:
- à Inspecção Geral do Trabalho, nas 48 horas seguintes à sua verificação e sem prejuízo das devidas participações à empresa seguradora, ao Ministério da Saúde e outras instituições competentes (art.º 41 do Regulamento da IGT, aprovado pelo Decreto n.º 45/2009, de 14 de Agosto);
- ao Ministério de tutela, isto é, do Ministério do sector em que insere a empresa;
- à entidade seguradora, no prazo estabelecido pela respectiva apólice, nos casos em que tenha sido celebrado um contrato de seguro dos seus trabalhadores (art.º 27, n.ºs 1 e 2 do RJATDP).
Esta participação do acidente de trabalho ou doença profissional ao Ministério Público junto do Tribunal do Trabalho, pode também ser feita, embora com carácter facultativo:
- pelo sinistrado, directamente ou por interposta pessoa;
- pela autoridade que tenha tomado conhecimento do acidente de trabalho, quando o sinistrado seja incapaz;
- pelo director do estabelecimento hospitalar, acção social ou prisional onde o sinistrado se encontrava, se o acidente tiver ocorrido ao serviço de outra entidade (art.º 30 do RJATDP).
A lei prevê ainda um regime específico de participação de acidentes ocorridos a bordo das embarcações, a qual deve ser dirigida pelo capitão da embarcação ao capitão do porto onde ocorreu o acidente, ou no qual o barco atracar primeiro, se aquele tiver ocorrido no mar, contando-se o prazo desde a data do acidente ou da chegada a esse porto, devendo o capitão do porto proceder à imediata remessa daquela participação ao Ministério Público junto do Tribunal do Trabalho (art.º 28 do RJATDP).
Enfim, as empresas seguradoras devem participar ao Ministério Público junto do Tribunal do Trabalho, por escrito, no prazo de 3 dias a contar da alta, os acidentes de trabalho que tenham resultado em incapacidade permanente absoluta ou parcial e, imediatamente, após terem conhecimento, aqueles de que tenha resultado a morte do sinistrado (art.º 29 do RJATDP). Este dever de participação, em caso de morte do trabalhador sinistrado, ao Ministério Público junto do Tribunal do Trabalho e à Inspecção Geral do Trabalho, é igualmente obrigatório por parte da instituição de saúde em que a mesma tenha ocorrido (art.º 31 do RJATDP).
68.2. Dever de assistência
Em caso de acidente de trabalho ou doença profissional, o trabalhador por conta de outrem sinistrado tem direito à assistência médica e medicamentosa imediata (art.º 228 da LT e art.º 15 do RJATDP), a que corresponde, por parte do empregador, um “dever de assistência”, consubstanciado “prima facie” na prestação dos primeiros socorros e no transporte para um estabelecimento hospitalar adequado ao restabelecimento e reabilitação do sinistrado.
Este dever de assistência, para além do disposto no art.º 228 da LT, está pormenorizadamente regulado nos art.ºs 33 a 44 do RJATDP, traduzindo-se, designadamente, em:
- assistência médica e cirúrgica, geral ou especializada, incluindo todos os elementos de diagnóstico e tratamento necessários;
- assistência medicamentosa e farmacêutica;
- transporte para observação, tratamento ou comparência a actos judiciais;
- despesas com a hospitalização e estadia, direitos ao transporte e a estadia, que serão extensivos à pessoa que acompanhar o sinistrado, quando a natureza da lesão ou doença o exigir;
- fornecimento de ajudas técnicas e outros dispositivos técnicos de compensação de limitações funcionais (aparelhos de prótese e ortopedia), incluindo a sua renovação e reparação.
68.3. Direito à reparação
O direito de reparação de acidentes de trabalho e doenças profissionais que emerge da responsabilidade civil objectiva do empregador, fundada na ideia de que este deve suportar os danos decorrentes do acidente ou doença sofrida pelo trabalhador ao seu serviço, não sendo necessário demonstrar a existência da sua culpa, é mais abrangente do que o estatuído no art.º 229 da LT subordinado precisamente à epígrafe “Direito à reparação”.
Na verdade, julgamos que o direito à reparação configura um conceito mais alargado do que o disposto no art.º 229, compreendendo as seguintes prestações:
- em espécie: prestações de natureza médica e medicamentosa e quaisquer outras desde que necessárias à recuperação do sinistrado, fornecimento e renovação normal dos aparelhos de prótese e ortopedia, transporte do sinistrado para as deslocações necessárias para observação e tratamento, incluindo as de um familiar quando aquele tiver de ser transportado para um estabelecimento de saúde distante do seu local de residência (art.º 228 da LT e art.º 19/2 do RJATDP), incluídas no dever de assistência já referido no ponto anterior;
- em dinheiro: indemnização por incapacidade temporária absoluta ou parcial para o trabalho, indemnização em capital ou pensões em caso de incapacidade permanente correspondente à redução de capacidade de ganho, pensões de sobrevivência aos familiares, subsídios de funeral e morte (art.ºs 228, n.ºs 4 e 5, e 233 da LT e art.º 19/2 do RJATDP), que analisaremos mais adiante em pormenor.
O direito à reparação abrange, portanto, igualmente, a obrigação de o empregador promover a reabilitação do trabalhador sinistrado ou afectado por doença profissional, colocando-o em posto de trabalho compatível com a sua “capacidade residual” (aferida pelos critérios definidos no art.º 230) (191) e assegurando-lhe previamente todas as condições necessárias ao exercício dessas funções (por ex., formação profissional, um período de adaptação ao novo posto de trabalho, etc.), como decorre do disposto no n.º 2 deste art.º 229, bem como no n.º 2 do art.º 16 do RJATDP.
A rescisão do contrato de trabalho baseada na impossibilidade de reabilitação do trabalhador incapacitado em resultado de acidente de trabalho ou doença profissional e na inexistência no organigrama da empresa de lugar compatível com a sua capacidade residual, confere ao incapacitado o direito à indemnização prevista no art.º 128 da presente lei (cfr. n.º 3 do art.º 229 da LT e art.º 16/3 do RJATDP).
Neste âmbito do direito à reparação, há ainda que ter em conta o disposto no n.º 4 do art.º 229 que determina que a predisposição patológica do sinistrado não exclui o direito à reparação se for conhecida do empregador, princípio que é desenvolvido no art.º 12 do RJATDP. (192)
A predisposição patológica está apenas contemplada no n.º 1 do art.º 12 do RJATDP, sendo que as outras situações (incapacidades) ali referidas têm um âmbito material diferente. (193)
A predisposição patológica não é uma doença, constituindo, antes, um estado do organismo humano que torna o indivíduo propenso para vir a sofrer de determinadas doenças, funcionando o acidente, nesta situação, como causa próxima desencadeadora da lesão ou da doença.
Nos termos do disposto no n.º 4 do art.º 229 da LT, conjugado com o art.º 12/1 do RJATDP, a predisposição patológica não exclui o direito à reparação integral do acidente de trabalho, salvo se tiver sido ocultada. Para que funcione a exclusão da reparação em caso de predisposição patológica, entendemos não ser necessário que a ocultação tenha sido dolosa, bastando a mera ocultação negligente para a exclusão da obrigação de reparação do acidente.
68.4. Seguro de acidentes de trabalho e doenças profissionais
O art.º 231 da LT bem como o art.º 7/1 do RJATDP, estipulam a obrigatoriedade (194) da existência de um seguro privado, celebrado pela entidade empregadora (tomador do seguro) a favor dos seus trabalhadores, mediante o qual o empregador transfere a responsabilidade pelos danos decorrentes de acidentes de trabalho ou doenças profissionais para uma companhia de seguros legalmente autorizada na República de Moçambique.
O empregador deve, assim, possuir um seguro colectivo para a cobertura de eventuais acidentes de trabalho e doenças profissionais que abranja os respectivos trabalhadores desde a data da sua admissão ao trabalho (art.º 7/3 do RJATDP).
A Apólice Uniforme do Seguro de Acidentes de Trabalho e Doenças Profissionais adequada às diferentes profissões e actividades, de harmonia com os princípios estabelecidos no RJATDP, é aprovada pelo Instituto de Supervisão de Seguros de Moçambique (ISSM), entidade de supervisão de seguros em Moçambique, ouvidas as associações representativas das empresas de seguros, e cujos objectivos são os seguintes:
- adequar o seguro de acidentes de trabalho às diferentes profissões e actividades prestadas;
- estabelecer um princípio de graduação dos prémios ao grau de risco, atendendo à natureza da actividade e condições de prevenção nos locais de trabalho,
- possibilitar a revisão do valor do prémio do seguro, por iniciativa da seguradora ou do empregador, quando ocorra modificação das efectivas condições de prevenção de acidentes nos locais de trabalho e de doenças profissionais (art.º 8 do RJATDP).
Independentemente de a entidade empregadora poder celebrar seguros complementares mais favoráveis (art.º 7/2 do RJATDP), a celebração da apólice de seguro de acidentes de trabalho e doenças profissionais deve estabelecer um princípio de graduação dos prémios em função do respectivo grau de risco (art.º 8/2 do RJATDP), isto é, deve ser formalizada tendo em conta o risco profissional normal (art.º 231) ou o risco profissional agravado para os trabalhadores expostos a actividades de particular risco profissional (art.º 232).
68.5. Pensões e indemnizações
Os trabalhadores incapacitados por acidentes de trabalho ou doenças profissionais têm direito a:
(i) Pensões (art.º 52 do RJATDP) (195)
Se o acidente ocasionar uma incapacidade de trabalho permanente ao sinistrado, este terá direito:
- a uma pensão anual e vitalícia igual a 90% da remuneração anual, em caso de incapacidade permanente absoluta;
- a uma pensão anual e vitalícia correspondente a 70% da redução sofrida na capacidade geral de ganho, em caso de incapacidade permanente parcial igual ou superior a 30%;
- ao capital de remição de uma pensão anual e vitalícia correspondente a 70% da redução sofrida na capacidade geral de ganho, em caso de incapacidade permanente parcial inferior a 30%.
(ii) Indemnizações (art.º 53 do RJATDP)
Se o acidente ocasionar uma incapacidade de trabalho temporária ao sinistrado, este terá direito:
- a uma indemnização diária igual a 70% da remuneração, em caso de incapacidade temporária absoluta;
- a uma indemnização diária igual a 70% da redução sofrida na capacidade geral de ganho, em caso de incapacidade temporária parcial.
(iii) Pensões anuais de sobrevivência, para os familiares, em caso de morte do trabalhador sinistrado (art.º 45 do RJATDP)
60% da remuneração anual do sinistrado para o cônjuge, pessoa em união de facto ou cônjuge judicialmente separado à data do acidente e com direito a alimentos, até ao limite do montante dos alimentos fixados judicialmente; se houver concorrência entre os beneficiários aqui referidos, a pensão é repartida na proporção dos respectivos direitos;
- 25% da remuneração anual para os filhos – sendo equiparados a estes os enteados do sinistrado, desde que este estivesse obrigado à prestação de alimentos – incluindo os nascituros e adoptados à data do acidente, até perfazerem 18, 21 ou 25 anos, se estiverem a frequentar o ensino básico, secundário ou superior, respectivamente; ou sem limite de idade quando afectados por doença física ou mental que os torne absolutamente incapazes para o trabalho; 30% da remuneração anual do sinistrado se for apenas um, 50% se forem dois ou mais, recebendo o dobro destes montantes, até ao limite de 80% da remuneração anual do sinistrado, se forem órfãos de pai e mãe;
- aos descendentes e quaisquer parentes sucessíveis à data do acidente até perfazerem 18, 21 ou 25 anos, enquanto frequentarem, respectivamente, o ensino básico, secundário ou curso equiparado ou o ensino superior, ou sem limite de idade quando afectados por doença física ou mental que os torne absolutamente incapazes para o trabalho, desde que o sinistrado contribuísse com regularidade para o seu sustento: a cada, 15% da remuneração anual do sinistrado, não podendo o total das pensões exceder 80% desta. Se não houver cônjuge, pessoa em união de facto ou filhos com direito à pensão, os parentes aqui mencionados e nas condições referidas, receberão, cada um 15% da remuneração do sinistrado, não podendo o total das pensões exceder 80% da remuneração do sinistrado, para o que se procederá a rateio, se necessário;
- se o cônjuge, pessoa em união de facto ou o cônjuge judicialmente separado à data do acidente e com direito a alimentos contrair casamento ou voltar a viver em união de facto receberá, por uma só vez, o dobro do valor da pensão anual, extinguindo-se com esse recebimento o direito à respectiva pensão, excepto se já tiver ocorrido a remição total da pensão.
A acumulação e o rateio das pensões de sobrevivência são efectuados nos termos do art.º 46 do RJATDP.
No caso de o sinistrado estar afectado por incapacidade permanente anterior ao acidente, a reparação será apenas a correspondente à diferença entre a indemnização pela incapacidade anterior e a que for calculada como se tudo fosse imputado ao acidente (n.º 3 do art.º 12 do RJATDP). (196)
§ 1. Data de vencimento de pensões e indemnizações
As pensões e indemnizações por incapacidade permanente começam a vencer-se no dia seguinte ao da alta e as devidas por incapacidade temporária, no dia seguinte ao do acidente (n.º 1 do art.º 234 da LT e art.º 54/2 do RJATDP).
As pensões por morte começam a vencer-se no dia seguinte ao da verificação do óbito (art.º 234/3 da LT e art.º 46/5 do RJATDP).
Nos casos de incapacidade permanente, pode ser atribuída uma pensão provisória (que se destina a garantir ao sinistrado uma protecção adequada e oportuna sempre que se verifiquem atrasos na atribuição das prestações), a qual é estabelecida entre o dia seguinte ao da alta e o momento da fixação da pensão definitiva (art.º 55/1 do RJATDP).
A pensão provisória por incapacidade permanente é atribuída pela entidade responsável e calculada nos termos do Regulamento de Acidentes de Trabalho e Doenças Profissionais com base nos coeficientes de desvalorização definidos pela Junta Nacional de Saúde, devendo haver correcção de eventuais diferenças entre a pensão provisória e a definitiva, aquando da fixação final da pensão (art.º 55, n.ºs 2, 3 e 4 do RJATDP).
A revisão da pensão por incapacidade permanente pode ainda ser requerida por qualquer beneficiário, invocando modificação nessa incapacidade, desde que, sobre a data da fixação da pensão ou da última revisão, tenham decorrido mais de 6 meses e menos de 5 anos, mediante a apresentação do mapa da Junta Nacional de Saúde (art.º 234/3 da LT e art.º 49 do RJATDP). Note-se, contudo, que, nos casos de doenças profissionais, a revisão da pensão não está sujeita àqueles prazos, podendo ser requerida a qualquer tempo.
(a) Actualização de pensões
As pensões por acidentes de trabalho e doenças profissionais devem ser actualizadas periodicamente pela entidade responsável, sempre que se registar variação do salário mínimo nacional, actualização que não pode ser inferior a 60% do SMN aplicável no sector de actividade a que pertencia o sinistrado (art.º 56 do RJATDP).
(b) Remição de pensões
A remição consiste no pagamento das pensões devidas, no todo ou em parte, sob a forma de um capital único.
As condições de remição das pensões estão estabelecidas nos art.ºs 64 a 67 do RJATDP, sendo obrigatoriamente remidas as pensões anuais, devidas a:
- sinistrados e beneficiários legais de pensões vitalícias que não sejam superiores a 10 vezes o SMN mais elevado do sector de actividade, à data da fixação da pensão;
- sinistrados, independentemente do valor da pensão anual, por incapacidade permanente parcial inferior a 30%.
§ 2. Perda do direito à indemnização
No art.º 235 da LT (alíneas a) a d)) prevêem-se as situações em que o trabalhador sinistrado perde o direito à indemnização devido a actos praticados ou não observados, voluntariamente, i.é, actos que, por serem imputáveis ao sinistrado, determinam a exclusão do direito à indemnização.
Trata-se de uma enunciação taxativa, pelo que não são admitidas outras causas de perda do direito.
§ 3. Prescrição do direito à indemnização
A prescrição consiste na extinção de um direito por motivo do seu não exercício durante um dado lapso de tempo estabelecido na lei. Em regra, todo o direito é prescritível, excepto quando se trate de um direito indisponível ou quando a lei expressamente excluir a prescrição. O prazo da prescrição é contínuo mas suspende-se e interrompe-se apenas nos casos estabelecidos na lei.
A prescrição do direito à indemnização e do direito às prestações devidas por acidentes de trabalho e doenças profissionais está regulada no art.º 236 da LT e no art.º 68 do RJATDP.
Assim, a prescrição destes direitos ocorre se não forem exercidos no prazo de 1 ano a contar da data da alta clínica formalmente comunicada ao sinistrado ou da data do acidente, se este ocasionar morte ou incapacidade permanente absoluta ou parcial.
As prestações estabelecidas por decisão judicial ou por acordo das partes, quer vencidas quer vincendas, prescrevem no prazo de 3 anos, a partir da data do seu vencimento, prazo que se conta a partir do trânsito em julgado da sentença ou da homologação do acordo das partes, se não tiver sido feito qualquer pagamento.
O prazo de prescrição não começa nem corre se o empregador, não tendo transferido a sua responsabilidade para uma companhia seguradora, conservar ao seu serviço o sinistrado depois do acidente e enquanto o conservar.
Por fim, a prescrição interrompe-se se o sinistrado aceitar da entidade responsável qualquer prestação em dinheiro ou em espécie em troca do que legalmente lhe foi devido.
Notas:
(191) O n.º 1 do art.º 230 prevê que a “capacidade residual” do sinistrado, resultante da incapacidade provocada por acidente de trabalho ou doença profissional, será expressa em coeficientes determinados em função da natureza e da gravidade da lesão, do estado geral da vítima, da sua idade e profissão, da maior ou menor readaptação obtida para a mesma ou outra profissão, bem como das demais circunstâncias que possam influir na sua capacidade geral de ganho.
A incapacidade por motivo de acidente de trabalho e a consequente “capacidade residual” são avaliadas de acordo com a Tabela Nacional de Incapacidades por Acidentes de Trabalho e Doenças Profissionais (cuja publicação ainda se aguarda) que será revista e actualizada por uma comissão cuja composição, competência e modo de funcionamento são fixados por diploma do Ministro da Saúde (art.º 62 do RJATDP).
(192) O artigo 12 do RJATDP dispõe o seguinte:
1. A predisposição patológica da vítima do acidente não exclui o direito à reparação integral, salvo quando tiver sido ocultada no momento da sua admissão.
2. Quando a lesão ou a doença for agravada por lesão ou doença anterior, ou quando esta for agravada por acidente, a incapacidade avaliar-se-á como se tudo dele resultasse, a não ser que pela lesão ou doença anterior o sinistrado já esteja a receber pensão ou tenha recebido um capital nos termos do artigo 52 deste regulamento.
3. No caso de o sinistrado estar afectado por incapacidade permanente anterior ao acidente, a reparação será apenas a correspondente à diferença entre a incapacidade anterior e que for calculada como se tudo fosse imputado ao acidente.
4. Sem prejuízo do disposto no número anterior, quando do acidente resulte a inutilização ou danificação dos aparelhos de prótese de que o sinistrado já era portador, o mesmo terá direito à sua reparação ou substituição.
5. O sinistrado tem direito igualmente à reparação da lesão ou doença que se manifeste durante o tratamento da lesão ou doença resultante de um acidente de trabalho e que seja consequência de erros médicos.
(193) O n.º 2 do art.º 12 do RJATDP nada tem que ver com a predisposição patológica, antes prevendo as situações de avaliação de incapacidade resultantes de:
- lesão ou doença anterior ao acidente que agrave a lesão ou doença subsequente ao acidente;
- agravamento da lesão ou doença anterior ao acidente por causa de lesão ou doença subsequente ao acidente.
Em qualquer das situações, a incapacidade avalia-se como se tudo resultasse do acidente, excepto se, pela lesão ou doença anterior, a vítima já esteja a receber pensão ou tenha recebido um capital de remição, nos termos do art.º 52 do dito Regulamento.
(194) Sobre a obrigatoriedade de os empregadores possuírem um seguro colectivo de cobertura dos respectivos acidentes de trabalho e doenças profissionais que abranja os respectivos trabalhadores, vide Acórdão do TS de 13.03.2008 - Apelação n.º 56/05-L (BR, III Série, n.º 5, de 4/02/2010), e Acórdão do TS de 26.04.2007 - Recurso de apelação n.º 110/03-L (www.saflii.org/mz).
(195) O pagamento destas pensões não está a cargo da Segurança Social (Instituto Nacional da Segurança Social) porque o sistema de segurança social não protege os trabalhadores em situações de acidentes de trabalho e doenças profissionais. Como se referiu (cfr. supra 68.4) a responsabilidade do empregador por acidentes do trabalho ou doenças profissionais tem obrigatoriamente de ser transferida para uma seguradora, isto não só para a protecção do trabalhador, que tem aí uma garantia dos seus direitos, mas também para a própria protecção dos empregadores, cujo património, sobretudo no caso de empresas de pequena ou média dimensão, poderia ficar afectado caso tivessem de suportar directamente os encargos com as indemnizações ou pensões devidas por motivo de acidente de trabalho ou de doença profissional.
(196) Vide Acórdão do TS, de 26.04.2007 - Apelação n.º 1110/03-L (www.saflii.org/mz): “Quanto ao argumento que a agravante invoca como fundamento para impugnar o despacho recorrido, pelo facto de o agravado ter já beneficiado de indemnização emergente de anterior acidente de trabalho, trata-se de um fundamento que não pode proceder, tendo em conta o que se lê no artigo 14, parágrafo 4, das condições gerais do seguro (fls. 16).
Por outro lado, ao abrigo do disposto no artigo 6.º do Diploma Legislativo n.º 1706, a reparação do sinistrado ora agravado, que já sofria de incapacidade anterior ao acidente actual, há-de corresponder à diferença entre as duas incapacidades, ou seja, trata-se de encontrar uma diferença de graus de incapacidades e não sendo, atendível a oposição da agravante com fundamento de o agravado ter beneficiado já de indemnização emergente de anterior acidente de trabalho”.
(197) Despacho do Ministério da Economia e Finanças de 16.03.2018 (BR, I Série, n.º 109, de 4 de Junho de 2018) aprovou as bases técnicas aplicáveis ao cálculo do capital de remição das pensões de acidentes de trabalho e doenças profissionais e aos valores de caucionamento das pensões de acidentes de trabalho e doenças profissionais a que as entidades empregadoras tenham sido condenadas judicialmente ou a que se tenham obrigado por acordo homologado judicialmente e as respectivas tabelas práticas, constantes dos Anexos I e II.
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