09 março, 2021

Regimes remuneratórios especiais

50. Regimes remuneratórios especiais 

50.1. Remuneração por trabalho extraordinário, excepcional e nocturno 
Como vimos (II.39) o legislador moçambicano distingue entre «trabalho extraordinário» – o que é prestado para além do período normal de trabalho (art.º 90) –, e «trabalho excepcional» - o que é realizado em períodos que constituem tempo de descanso do trabalhador (dias de descanso semanal, complementar ou feriado - art.º 89/1). Por isso, também a remuneração acrescida é diferente para estes dois tipos de trabalho. Assim:

(i) Trabalho extraordinário 
 A prestação de trabalho extraordinário confere ao trabalhador o direito a remuneração acrescida: a lei estabelece os acréscimos sobre a remuneração normal de 50% se o trabalho for prestado até às 20 horas, e de 100% se prestado para além das 20 horas e até à hora de início do período normal de trabalho do dia seguinte (art.º 115/1). 

(ii) Trabalho excepcional 
Já o trabalho excepcional é sempre pago com um acréscimo de 100% sobre a remuneração do trabalho normal (art.º 115/2). 

(iii) Trabalho nocturno 
No que respeita à retribuição, o trabalho nocturno confere o direito a um acréscimo de 25% sobre a remuneração correspondente ao trabalho prestado durante o dia (art.º 115/3). 
Embora a lei seja omissa, atendendo à natureza das normas que regulam a remuneração do trabalho extraordinário, excepcional e nocturno, entende-se não haver impedimento legal que impossibilite que os acréscimos previstos pelo legislador possam ser aumentados a nível de contrato de trabalho ou de IRCT.
Também no caso de o trabalho nocturno ser simultaneamente extraordinário ou excepcional, julgamos que o trabalhador beneficia dos acréscimos previstos para cada uma destas modalidades. Não assim, quando o trabalho nocturno seja realizado simultaneamente com o de turnos (art.º 91/1), situação em que o trabalhador não beneficia dos eventuais acréscimos remuneratórios previstos para cada uma destas modalidades (cfr. supra II.38).

50.2. Remuneração por trabalho a tempo parcial ou estágio 
(i) Trabalhador a tempo parcial 
Como referimos a propósito da noção de trabalho a tempo parcial (II.40), a LT consagra o princípio da “igualdade de tratamento” entre os trabalhadores a tempo parcial e a tempo inteiro, pelo que os trabalhadores, a tempo parcial, não podem ter um tratamento menos favorável do que os trabalhadores a tempo completo em situação comparável, a menos que, por razões objectivas, a diferença de tratamento se justifique. 
Por isso, no tocante à remuneração, o n.º 1 do art.º 116 estabelece que o trabalhador a tempo parcial tem direito à remuneração auferida por trabalhadores a tempo inteiro numa situação comparável (mesma categoria profissional ou função) em proporção do respectivo período normal de trabalho (semanal ou diário) efectivamente prestado. 
Embora a lei não o contemple expressamente, entendemos que o âmbito do art.º 116/1 abrange, não só a remuneração, como as demais prestações de carácter remuneratório que também são devidas ao trabalhador de forma proporcional ao tempo de trabalho prestado. 

(ii) Estagiários 
A remuneração dos trabalhadores estagiários (recém-formados em regime de estágio laboral após formação profissional) têm direito a uma remuneração não inferior em 75% da remuneração correspondente à da mesma categoria profissional do trabalhador efectivo, salvo se já forem trabalhadores da empresa, caso em que mantêm a remuneração auferida, se o valor remuneratório acordado para o estágio for inferior (art.º 116, n.ºs 2 e 3). 

50.3. Remuneração dos cargos de confiança ou chefia 
O art.º 117 da LT fixa a remuneração do trabalhador que exerça cargos de chefia ou de confiança: tem direito à remuneração correspondente ao do cargo de chefia ou confiança para que é nomeado, ou se esta for inferior à que o trabalhador já auferia, a uma remuneração adicional mínima de 20% enquanto se mantiver no exercício dessas funções (n.º 3). 
Este regime remuneratório especial abrange não só os trabalhadores nomeados para exercerem cargos de chefia ou confiança nos termos do n.º 2 do art.º 117, mas também, como se referiu (cfr. supra II.22.3.2.), dos que os exerçam em regime de comissão de serviço (art.º 38/4, alínea g)). 
Cessando o exercício das funções de chefia ou de confiança, o trabalhador tem direito (n.º 1 do art.º 117): 
  • ao regresso à categoria profissional desempenhada antes da comissão de serviço ou a correspondente a novas funções que passe a ocupar; 
  • à remuneração correspondente à categoria profissional assim desempenhada. (133)
50.4. Remuneração por isenção de horário de trabalho (IHT) 
Pelas implicações que comporta para o trabalhador – a IHT implica uma maior disponibilidade para o trabalho, já que são mais prolongados os limites temporais durante os quais o trabalhador fica sujeito ao poder de direcção do empregador – os trabalhadores isentos de horário de trabalho têm direito a uma remuneração especial (subsídio de isenção de horário de trabalho), cujo montante e demais condições de atribuição, duração e cessação devem ser fixadas por contrato individual de trabalho ou por IRCT - art.º 118. 
Os trabalhadores que ocupem cargos de chefia ou de direcção embora possam ser isentos de horário de trabalho – aliás, a “IHT” é reservada pela lei como regime de horário especifico de determinados profissionais como os que exercem “cargos de chefia e direcção" (art.º 87/5, alínea a)) por corresponder às características particulares das actividades desempenhadas por estes – não têm direito ao subsídio de isenção de horário de trabalho, por se considerar que este se encontra já incorporado na remuneração dos titulares desses cargos (art.º 118, n.º 1, in fine). 

50.5. Remuneração por substituição ou acumulação de chefias 
Nas situações de exercício em «regime de substituição» de funções não compreendidas na respectiva categoria profissional, com uma duração superior a 45 dias e se lhes corresponder um tratamento mais favorável, o trabalhador tem direito a auferir, enquanto durar a substituição, a remuneração da categoria correspondente ou, se já recebia uma remuneração superior, a um acréscimo remuneratório a acordar com o empregador (art.º 119/1). 
Do mesmo modo, no caso de «acumulação de funções de chefia» por período igual ou superior a 45 dias, o trabalhador tem direito a auferir um suplemento remuneratório correspondente, no mínimo, a 25% da remuneração do cargo de chefia desempenhado em acumulação e enquanto esta persistir (art.º 119/2).

Notas: 
(133) Na doutrina moçambicana, Carlos Pedro Mondlane “Concretização prática da situação dos cargos laborais de direcção empresarial - Regime jurídico da comissão de serviço”. 
Na doutrina em geral, Monteiro Fernandes “Direito do Trabalho”, pp. 228-230; Maria do Rosário Palma Ramalho “Direito do Trabalho - Parte II - Situações Laborais Individuais”, pp. 284 e ss. 
Jurisprudência: Acórdão do Tribunal Supremo de 23.09.2010 - Proc.º n.º 121/05-L (BR, III Série, n.º 23, de 6/06/2012): 
“1. De conformidade com o disposto pelo n.º 1 do artigo 56, da Lei n.º 8/98, de 20 de Julho, pelo exercício de cargo de chefia ou de confiança, é devida uma remuneração correspondente, deixando de ser devido tal pagamento logo que cesse o desempenho de tais funções. 
2. A simples continuidade do pagamento de um subsídio de funções de chefia e confiança para além do período legalmente definido por lei, nos termos acima referenciados, pelas mais diversas razões que sejam, sem excluir inclusive a mera inércia de devida acção, não pode converter essa prestação de facto numa obrigação legal, susceptível de ser objecto de exigibilidade judicial por parte do eventual beneficiário. 
3. Consequentemente, nesta situação, não se verifica qualquer redução do salário, não havendo, por isso, violação do princípio da irredutibilidade do salário, nos termos preceituados no n.º 1 do artigo 54 da Lei n.º 8/98, de 20 de Julho.”

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