31 outubro, 2021

Sucessão das CCT´s

87. Sucessão das CCT´s 
O n.º 1 do art.º 177 da LT determina que “os IRCT’s se mantêm integralmente em vigor até serem modificados ou substituídos por outros”. É nesta modificação ou substituição de uma convenção colectiva por outra da mesma natureza e com idêntico âmbito de aplicação que consiste o fenómeno da sucessão das CCT´s. 
O problema específico que suscita a sucessão de convenções é o de saber se a lei permite ou não o denominado “retrocesso social”, ou seja, se permite ou não a eliminação ou redução de direitos consagrados em convenção anterior. 
A LT é omissa sobre a matéria, não tendo disposição semelhante à existente em ordenamentos jurídicos estrangeiros (como é o caso do artigo 503.º do Código do Trabalho português), em que se estabelece que os direitos decorrentes de convenção colectiva só podem ser reduzidos por nova convenção de cujo texto conste, em termos expressos, o seu carácter globalmente mais favorável, sendo que, a nova convenção prejudica os direitos decorrentes de convenção anterior, salvo se, nesta nova convenção, aqueles forem expressamente ressalvados pelas partes. Ou seja, admite-se o retrocesso se a perda ou redução de direitos for trocado por um conjunto de normas globalmente mais favorável, desde que as partes nisso consintam e acordem. (229) 
Independentemente da inexistência de norma semelhante no direito laboral moçambicano, não parece em qualquer caso defensável a ideia de protecção e irreversibilidade da tutela dos direitos ditos “adquiridos” nos casos de sucessão das CCT´s. 
Mesmo que defendamos (cfr. supra IV 85.4.) que o ordenamento laboral moçambicano acolhe a fórmula da recepção automática das normas das CCT´s nos contratos individuais de trabalho, tal não significa que não existam consideráveis limitações na aplicação do referido princípio, designadamente quando estão em causa a manutenção dos direitos adquiridos na sucessão das CCT´s. 
No ilustre ensinamento de Giugni (230)não se pode entender que as normas da convenção colectiva, penetrando no contrato individual, geram um direito adquirido à conservação do tratamento por parte dos indivíduos mesmo no confronto com a autonomia colectiva. Ao conformar a regulamentação da relação de trabalho individual, a convenção colectiva não perde a sua natureza heterónoma perante o contrato individual. Em outros termos, a cláusula do contrato individual conformada segundo a norma colectiva segue naturalmente a sorte desta última, ficando permanentemente exposta ao efeito integrativo por parte dela: é por isso inegável que uma modificação surgida na esfera da autonomia colectiva se reflicta nos conteúdos do contrato individual disciplinados por ela”, concluindo mesmo que “qualquer modificação que tenha ocorrido na esfera da autonomia colectiva se reflecte sobre os conteúdos do contrato individual, sem distinção entre modificações para pior ou para melhor”. 
De harmonia com o disposto na lei (art.º 177 da LT), as CCT´s são acordos destinados a vigorar por um certo prazo acordado pelas partes, cuja vigência pode ser denunciada por qualquer das partes, e que se mantêm integralmente em vigor até serem modificados ou substituídos por outros 
Ora, as convenções colectivas, são como qualquer outro contrato, negócios modificáveis. 
Por outro, não se vê como será defensável a ideia da limitação da autonomia colectiva das partes, se estas decidirem livremente reduzir ou abdicar de direitos em convenção colectiva sucedânea. Pense-se, por exemplo, em situações de crises prolongadas e de deterioração em termos reais das condições dos trabalhadores afectados por aquelas, em que pode ser do interesse dos próprios sindicatos aceitar transitoriamente a diminuição de regalias estabelecidas em CCT´s e aceitar até convenções globalmente menos favoráveis e, com isso, obter uma legitimidade negocial reforçada numa perspectiva futura do fim da crise e de um novo ciclo de prosperidade. 
Os próprios princípios constitucionais da “liberdade sindical” e da “autonomia, opõem-se, a nosso ver, a uma “eternização” das regalias constantes de convenção colectiva, sendo por isso lícito às partes reduzir expressamente as condições de trabalho estabelecidas em anteriores convenções, quer globalmente quer pontualmente. (231) 

Notas: 
(229) Sobre a matéria da sucessão das CCT´s, vide Maria do Rosário Palma Ramalho “Tratado de Direito do Trabalho - Parte III - Situações Laborais Colectivas” pp. 333-336; António Monteiro Fernandes “Direito do Trabalho” pp. 857-864. 

(230) Gino Giugni “Diritto Sindacale” Actualização de Lauralba Bellardi, Pietro Curzio e Mario Giovanni Garofalo, Cacucci Editore, 2010, pp. 174-177 

(231) Duarte da Conceição Casimiro, Transmissão da Empresa (…) p. 130 «As convenções colectivas, por via de regra, são celebradas para vigorar por um período determinado. Por conseguinte, diferentemente do que se passa com os contratos de trabalho por tempo indeterminado, as condições acordadas em IRCT apenas têm de manter-se até à data de rescisão ou do termo ou, ainda, até à data da entrada em vigor de uma nova convenção colectiva. Considerando, em especial, esta última possibilidade, nada obsta a que a nova convenção colectiva possa aumentar ou reduzir o conteúdo da anterior que veio substituir.»

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