48. Alteração do local do trabalho
No que respeita à segunda das questões enunciadas, isto é, à alteração do local de trabalho, tendo presente as implicações que essa alteração pode ter para ambas as partes, a lei procurou estabelecer um regime que acautele os interesses dos empregadores e trabalhadores.
Um dos elementos concretizadores da prestação de trabalho é, como se disse, o local em que ela deve ser executada: trata-se de um elemento relevante para a situação sócio-profissional do trabalhador e, desde logo, para a sua posição contratual. O local de trabalho desempenha assim uma função delimitadora relativamente à subordinação jurídica: é o centro estável (ou permanente) da actividade do trabalhador e a sua determinação obedece essencialmente ao intuito de se dimensionarem no espaço as obrigações e os direitos e garantias que a lei lhe reconhece.
Ora, atendendo ao interesse do trabalhador na estabilidade do local de trabalho é que a LT, no art.º 59, alínea h), estabelece a proibição do empregador alterar o local de trabalho, salvo nos casos previstos na lei, no contrato individual de trabalho ou nos IRCT’s. Consagra-se aqui o princípio da inamovibilidade do trabalhador estabelecendo-se uma proibição genérica de a entidade empregadora alterar o local de trabalho sem o acordo do trabalhador: a lei garante ao trabalhador que, contra vontade sua, é vedado à entidade empregadora transferi-lo para local de trabalho diferente daquele onde, por estipulação expressa ou tácita, venha exercendo as suas funções.
O princípio da inamovibilidade consagrado na alínea h) do art.º 59 comporta desvios – os decorrentes dos n.ºs 1 e 2 do art.º 75 – de acordo com o qual, o legislador considera lícita a transferência do trabalhador de local de trabalho por decisão unilateral do empregador (“jus variandi geográfico” ou “mobilidade geográfica”) (129), em duas situações:
(i) Transferência temporária
A transferência temporária do local de trabalho está circunscrita à ocorrência de motivos de carácter excepcional ligados à organização administrativa ou produtiva da empresa, limitando-se a lei a enunciar que tal facto deve ser comunicado ao órgão competente da administração do trabalho (art.º 75/1).
Parece, assim, decorrer da lei, que o empregador desde que invoque razões de natureza excepcional ligadas à organização produtiva da empresa, e o comunique à tutela da administração laboral, lhe é lícito transferir temporariamente o trabalhador do local do trabalho, sem que este se possa opor à transferência.
(ii) Transferência definitiva
A transferência definitiva do local de trabalho só pode ocorrer em resultado da transferência total ou parcial da empresa ou estabelecimento (art.ºs 74 e 75/2). Consagra-se nestes preceitos o princípio de que o empregador pode, por razões económicas ou de mercado ou por a tanto se ver obrigado por acto de autoridade (v.g., por imperativo de novas regras de higiene, de segurança, de urbanização, etc.), transferir todo o estabelecimento ou parte dele para outro local, caso em que é lícito ao empregador proceder à transferência dos trabalhadores de local de trabalho.
Nestas situações, o trabalhador:
- ou dá o seu acordo, acatando a ordem de transferência e acompanha o estabelecimento ou a empresa na sua mudança;
- ou se desliga da entidade empregadora, rescindindo o contrato de trabalho, invocando prejuízo sério, se a transferência implicar mudança do seu domicílio habitual, da qual resulte prejuízo sério, como por ex., o da separação da sua família.
Se optar pela primeira via, tem direito a que o empregador lhe pague as despesas feitas e directamente impostas pela transferência, incluindo as que decorrem da mudança de residência do trabalhador e do seu agregado familiar.
Se, ao invés, optar pela rescisão unilateral do contrato, a lei confere-lhe o direito de indemnização fixada nos termos do n.º 3 do art.º 130. A invocação de “prejuízo sério” constitui, assim, o pressuposto necessário para fundamentar a reacção do trabalhador à ordem de transferência do local de trabalho – dada pelo empregador no exercício legítimo dos seus poderes, nomeadamente, de mudar, total ou parcialmente, o estabelecimento onde aquele prestava trabalho – conferindo-lhe o direito a indemnização nos termos legalmente previstos.
A definição de “prejuízo sério” prevista no art.º 75/3 implica a concretização de um conceito indeterminado que terá de ser efectuada caso a caso, perante as circunstâncias de cada situação concreta – parecendo certo, no entanto, que não se deva tratar de um qualquer prejuízo, mas de um dano relevante, susceptível de determinar uma alteração substancial na rotina de vida do trabalhador. Efectivamente, embora a lei apenas enuncie “a separação do trabalhador da sua família” como motivo de prejuízo sério, o facto de a referir a título exemplificativo, significa que também outras situações susceptíveis de lhe causarem prejuízo sério podem ser invocadas pelo trabalhador.
Demonstrado o prejuízo sério, caso não queira aceitar a mudança, o trabalhador poderá rescindir o contrato, recebendo uma indemnização de montante igual à prevista no art.º 130. Porém, o empregador pode sempre eximir-se do pagamento da indemnização se provar «que da mudança não resulta prejuízo sério para o trabalhador».
(iii) Despesas impostas pela transferência
Em ambas as hipóteses, seja de transferência temporária, seja de transferência definitiva, a entidade empregadora tem de custear as despesas feitas pelo trabalhador «directamente impostas pela transferência», incluindo no caso de transferência definitiva as que decorrem da mudança de residência do trabalhador e do seu agregado familiar (art.º 75/5). (130)
Notas:
(129) Beijamim Alfredo, ob.cit. «Não sendo uma novidade de vulto, apresenta-se na Lei do Trabalho n.º 23/2007, o regime da modificação do contrato de trabalho com uma nova arrumação e com nuances. Disso se ocupam os arts. 70-78. O que na nossa Lei do Trabalho foi designado de “modificação do contrato de trabalho”, no Código de Trabalho de Portugal (CTP) é tratado de “mobilidade funcional”. Aqui temos mais uma matéria em que o nosso legislador se inspirou no seu homólogo português. A transferência do local de trabalho, a que também se denomina por “mobilidade geográfica”, diz respeito à prestação de trabalho (art. 194º do CTP)».
(130) Acórdão do Tribunal Supremo de 8.10.2009 - Proc.º n.º 226/05-L (BR, III Série, n.º 35, de 31 de Agosto de 2011): “Para efeitos do disposto no artigo 25 da lei n.º 8/98, de 20 de Julho, é irrelevante a terminologia que se utilize, porquanto, em qualquer caso e em face do condicionalismo envolvente em concreto, a mudança temporária ou definitiva de um local de trabalho para outro pertencente à mesma entidade empregadora, por necessidade de serviço, está-se perante uma verdadeira transferência do trabalhador para outro local de trabalho.
E, nestas circunstâncias a entidade empregadora está obrigada a custear as despesas que se mostrem inevitáveis, desde que as mesmas resultem e sejam impostas directamente pela transferência”.
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