109. Arbitragem voluntária
O regime da arbitragem voluntária consta dos art.ºs 190 a 193 da LT, aplicando-se-lhe subsidiariamente o disposto nos art.ºs 28 a 48 do RegCOMAL, e art.ºs 4 a 51 da Lei de Arbitragem, Conciliação e Mediação.
109.1. Designação de árbitros e constituição do comité arbitral
A arbitragem é realizada por árbitro individual (254) ou por comité arbitral (constituído por três árbitros), em que cada uma das partes nomeará um árbitro, e o terceiro, que preside, será designado pelo centro de mediação e arbitragem laboral (art.ºs 190/1 e 191/5 da LT).
O árbitro individual ou árbitro-presidente – nos casos em que a arbitragem seja realizada por um comité arbitral – deve ser nomeado pelo órgão de conciliação, mediação e arbitragem escolhido, nos 5 dias subsequentes ao pedido de arbitragem, o qual deve, igualmente, comunicar às partes a data, hora e local da arbitragem, bem como notificar as partes para cada uma delas nomear, no prazo de 3 dias, o árbitro de sua escolha, na hipótese de ser o comité arbitral a efectuá-la (n.ºs 3 e 4 do art.º 191 da LT).
Em concretização do disposto no art.º 190/1 da LT, sobre a constituição de comité arbitral, o art.º 31 do RegCOMAL preceitua:
- o comité arbitral é constituído por 3 elementos, designando cada uma das partes o seu árbitro e sendo o terceiro, que preside, nomeado pelo órgão de mediação e arbitragem laboral;
- os árbitros nomeados devem manter-se imparciais e independentes das partes e absterem-se de actuar como advogados de qualquer das partes, não devendo, antes ou depois da nomeação, prestar quaisquer informações a qualquer das partes sobre o mérito ou resultado da contenda;
- antes da sua nomeação pelo Centro de Mediação de Arbitragem Laboral (CMAL), cada árbitro deverá fornecer um resumo por escrito da sua actividade profissional passada e presente e concordar por escrito com os honorários fixados, devendo igualmente declarar por escrito a não existência de qualquer dúvida justificável em relação à sua imparcialidade ou independência e assumir o compromisso relativamente a essa mesma imparcialidade ou independência ou suspeição durante o processo de arbitragem;
- o CMAL designa o comité arbitral após a recepção da resposta do demandado ou, na falta de resposta, decorrido o prazo de 5 dias após a entrega da solicitação ao demandado, ainda que a solicitação do demandante ou a resposta do demandado esteja incompleta;
- na selecção dos árbitros o CMAL deverá ter em consideração o critério de selecção acordado pelas partes por escrito e atender à natureza e circunstâncias do litígio, nacionalidade, localização, idiomas e número das partes.
O n.º 2 do art.º 190 da LT impõe a todos os centros de mediação e arbitragem um dever de comunicação à Comissão de Mediação e Arbitragem Laboral, o qual tem como objectivo que esta tenha conhecimento dos diferendos em análise, de forma a conhecer como se estão a desenrolar os litígios sobre questões laborais.
Por último, os n.ºs 3 e 4 deste mesmo art.º 190 estabelecem as incompatibilidades entre a função de “árbitro” e as de gerente director, administrador, representante, consultor e trabalhador do empregador envolvido na arbitragem, assim como de todos aqueles que tenham interesse financeiro directo na arbitragem ou relações com qualquer das partes e ainda dos cônjuges, parentes em linha recta ou até ao terceiro grau da linha colateral, aos afins, adoptantes e adoptados daqueles.
109.2. Procedimento (255)
Nos termos do art.º 191 da LT desta disposição, sempre que a resolução de um conflito colectivo de trabalho não tenha sido obtida através de mediação, pode ser submetida a arbitragem, por acordo das partes (trata-se da autonomia colectiva) ou por uma das partes, caso em que a outra parte é obrigada a aceitar o procedimento arbitral (n.ºs 1 e 2).
A lei moçambicana – ao contrário de outros ordenamentos em que as partes podem a todo o tempo acordar em submeter os litígios laborais a arbitragem voluntária – condiciona a realização da arbitragem laboral voluntária, a que o litígio tenha sido previamente submetido a mediação, e que nesta, as partes não tenham chegado a acordo, o que julgamos contrariar a natureza da arbitragem voluntária.
O árbitro individual ou árbitro-presidente (nos casos em que a arbitragem seja realizada por um comité arbitral) deve ser nomeado pelo órgão de conciliação, mediação e arbitragem escolhido, nos 5 dias subsequentes ao pedido de arbitragem, o qual deve, igualmente, comunicar às partes a data, hora e local da arbitragem, bem como notificar as partes para cada uma delas nomear, no prazo de 3 dias, o árbitro de sua escolha, na hipótese de ser o comité arbitral a efectuá-la (n.ºs 3 e 4 do art.º 191).
O n.º 5 do art.º 191 consagra o “princípio da independência” dos árbitros, ao preceituar que devem conduzir o processo de arbitragem do modo que julgarem mais conveniente, sem prejuízo da adopção das formalidades mínimas exigíveis, e no sentido da resolução justa e célere do conflito que tenha em consideração essencialmente o mérito da causa.
No decurso da audiência, as partes em litígio têm a faculdade de produzir provas, arrolar testemunhas, formular perguntas e apresentar a respectiva argumentação, em conformidade com as normas procedimentais de funcionamento interno da arbitragem – regras essas que podem ser adoptadas discricionariamente pelo árbitro ou comité arbitral – podendo fazer-se representar pelos respectivos organismos representativos (associação sindical ou de empregadores) ou por mandatários (art.º 191, n.ºs 6 e 7).
109.3. Apoio técnico na arbitragem
Consagra-se no art.º 192 da LT o direito de os árbitros obterem a informação que julguem necessária à tomada de decisão, existindo na esfera das partes e dos organismos estatais competentes um dever jurídico de prestar essas informações, e também o de serem assistidos por peritos, o que facilmente se compreende, face às especificidades técnicas que podem estar em causa na arbitragem, bastando pensar-se nos conflitos laborais em sectores como os das tecnologias de informação, de energia, da banca ou de seguros (n.ºs 1 e 4, e art.º 40 do RegCOMAL).
Tanto os árbitros como os peritos que os assistam estão sujeitos a um “dever de sigilo” quanto às informações recebidas sob reserva de confidencialidade. (n.º 4, e art.º 48 do RegCOMAL).
109.4. Custos da arbitragem
Os custos da arbitragem voluntária são suportados pelas partes nos termos e condições por elas acordadas ou, na falta de acordo, em partes iguais, estando o comité arbitral ou árbitro impedidos de tomar decisão sobre a repartição das despesas da arbitragem, salvo se uma das partes ou o seu representante tiver agido de má-fé (art.º 192, n.ºs 2 e 3).
109.5. Decisão Arbitral
A decisão arbitral é proferida por escrito, acompanhada da respectiva fundamentação, no prazo de 30 dias a contar do último dia da audiência das partes, devendo ser enviada por cópia, a cada uma das partes, ao órgão de conciliação, mediação e arbitragem local e ao Ministério do Trabalho para efeitos de depósito, nos 15 dias subsequentes à tomada da decisão (art.º 191, n.ºs 8 e 9).
A razão da remessa ao ministério responsável pela área laboral tem subjacente o “depósito” da decisão arbitral, e o envio às partes a finalidade de lhes dar conhecimento da decisão, antes do seu depósito no Ministério do Trabalho, embora seja a partir deste acto que a decisão se torna eficaz.
A lei admite a possibilidade de o árbitro ou o comité arbitral poder, oficiosamente ou a pedido das partes, corrigir qualquer erro material contido na decisão arbitral (art.º 191/10).
Por seu turno, o art.º 193 da LT fixa os efeitos da decisão arbitral, fazendo-os corresponder aos de uma sentença judicial constituindo, por isso, título executivo (n.º 2). Dessa equiparação de efeitos deriva, em, consequência, a admissibilidade do recurso de anulação da decisão arbitral para os tribunais de trabalho, com a ressalva de que essa anulação só poderá ter lugar nos termos da legislação específica sobre a arbitragem laboral (n.ºs 3 e 4), pelo que há que ter em atenção o disposto nos art.ºs 41 a 47 do RegCOMAL e, subsidiariamente, os art.ºs 34 a 51 da Lei de Arbitragem.
Nos termos do art.º 41 do RegCOMAL, terminadas as diligências necessárias, o comité arbitral pronuncia a decisão arbitral, podendo proferir decisões arbitrais separadas sobre questões diferentes no mesmo momento ou em momentos diferenciados, as quais terão o mesmo efeito que qualquer outra decisão arbitral.
Se o comité arbitral for composto por mais de um árbitro e não houver acordo sobre qualquer questão em apreciação, a decisão será tomada por maioria, tendo em caso de empate o Presidente do comité arbitral direito a voto de qualidade.
No caso de algum árbitro se recusar a assinar a decisão arbitral, serão suficientes as assinaturas da maioria dos árbitros, ou tendo havido empate, a assinatura do Presidente, devendo tal facto constar da decisão arbitral.
O árbitro único ou o Presidente do comité arbitral é responsável pela remessa da decisão arbitral ao CMAL, o qual por sua vez envia cópias autenticadas às partes, desde que as custas de arbitragem tenham sido pagas.
Em caso de acordo das partes, o comité arbitral poderá homologá-lo sob a forma de decisão arbitral, desde que a homologação tenha sido solicitada pelas partes por escrito, decisão homologatória que deve mencionar expressamente o acordo das partes. Se após a confirmação por escrito pelas partes de que houve um acordo estes não solicitarem a homologação do mesmo, o comité arbitral será extinto e o processo de arbitragem encerrado.
Proferida a decisão arbitral – que é definitiva e vinculativa para as partes, excepto nos casos de pedido de correcção (art.º 43 do do RegCOMAL) ou de reclamação (art.º 44 do do RegCOMAL) da decisão arbitral –, ficam esgotados os poderes do comité arbitral quanto ao mérito da causa.
A decisão arbitral está sujeita ao formalismo enunciado no art.º 42 do RegCOMAL, que exige a sua fundamentação – salvo se as partes convencionarem que não haverá lugar a fundamentação ou se se tratar de sentença proferida com base num acordo das partes – e a redução a escrito, acompanhada dos seguintes elementos:
- a identificação das partes;
- o objecto do litígio;
- a referência à convenção de arbitragem;
- a decisão final;
- a fixação e repartição, pelas partes, dos encargos processuais;
- a identificação dos árbitros;
- o lugar da arbitragem, local, data em que a decisão foi proferida;
- a assinatura do árbitro ou árbitros (no processo arbitral com mais de um árbitro, são suficientes as assinaturas da maioria dos árbitros, desde que seja mencionada a razão da omissão das restantes).
Quanto ao cumprimento da decisão arbitral, o art.º 45 do RegCOMAL impõe que no prazo de 15 dias após a pronúncia da decisão arbitral, o comité arbitral envie uma cópia da decisão ao CMAL onde o processo foi tramitado, a fim de que este a comunique às partes. Por seu turno, o prazo para o cumprimento da decisão arbitral pelas partes é de 30 dias a contar da data da notificação às mesmas.
Nos casos em que qualquer das partes tenha solicitado a correcção de erros materiais (art.º 43 do RegCOMAL), o prazo de 5 dias conta-se a partir da data da notificação do comité arbitral sobre o pedido.
Enfim, nos 20 dias seguintes após a recepção da decisão arbitral ou da decisão corrigida (nos termos dos art.ºs 43 e 44 do do RegCOMAL) e não tendo sido interposto recurso de anulação, nem cumprida voluntariamente a decisão, as partes podem solicitar a execução judicial da decisão, a qual deve ser acompanhada dos seguintes documentos essenciais:
- cópia autenticada da decisão arbitral;
- documentos comprovativos da interpelação da parte em mora (art.º 46 do RegCOMAL)
Notas:
(254) No mesmo sentido de que a arbitragem pode ser realizada por um único árbitro (art.º 16/1 da Lei de Arbitragem, aplicável subsidiariamente à arbitragem laboral «O tribunal arbitral pode ser constituído por um único árbitro ou por vários, em número ímpar»); em sentido contrário, Tomás Luís Timbane “Arbitragem Laboral em Moçambique”, p.12 “Em primeiro lugar, no que se refere à composição do tribunal arbitral, os litígios devem ser solucionados através de um Comité Arbitral, constituído por 3 (três) elementos, designando cada uma das partes um e o terceiro que preside escolhido pelo órgão de mediação e arbitragem laboral. Exclue-se, assim, a possibilidade de resolução por um árbitro único.
Compulsando a lei, constata-se que há referências, em várias disposições (V. arts. 190, 191, n.ºs 5, 6, 8, 9 e 10, 192, n.ºs 1 e 3 e 4 da Lei de Trabalho), a comité arbitral e árbitro, dando a ideia de que um árbitro único pode solucionar um litígio submetido a arbitragem. Por exemplo, os n.ºs 8 e 9 do art. 191 referem-se ao dever do árbitro, individualmente considerado, enviar cópia da decisão. Nota-se, entendemos nós, que este é um dever do árbitro mas sempre integrado no comité arbitral, pois não é o árbitro que envia a cópia, mas sim o comité arbitral. Relativamente a esta situação, a ALT era mais simples, pois nunca se referia a árbitro mas a comité arbitral (arts. 119 e 120), sendo que no único caso que fazia referência a árbitro, fazia-o no plural, como no art. 122, n.º 2, entendendo-se, aí, que se referia ao comité arbitral”.
(255) Sobre o funcionamento e tramitação do processo de arbitragem no âmbito da COMAL, vide os art.ºs 28 a 30 (pedido, resposta, notificações e prazos), art.º 31 (nomeação do comité arbitral), 34 (processo de arbitragem), 35 (foro de arbitragem e local de audiências), 36 (representação das partes), 37 (audiências), 38 (poderes adicionais do comité arbitral), e 39 (testemunhas) do respectivo Regulamento, devendo ainda ser tidos em conta os art.ºs 25 a 33 da Lei de Arbitragem.
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